quinta-feira, abril 16, 2020

ESTE ACORDAR D’ARQUIPÉLAGO (Novembro, 1986)


Há um poema
A escrever,
Um dia,
De preferência
Por um profissional da poesia,
Sobre este tempo,
Este lento acordar
Do coletivo sentimento
D’inventar e completar
E transformar o pensamento;

Por ora,
Por aqui,
Fica apenas emprestado
Ao tempo e ao poeta a vir
O anotar
Deste mágico acordar das ilhas
Na cidade,
Como se dia a dia,
Hora a hora,
Se dissipasse
O vasto e sinistro mar
Do recíproco desconhecermo-nos
No público cantar dos pássaros.

Este acordar d’arquipélago,
Ilha a ilha,
Porto a porto,
Perto,
Cada vez mais perto,
Perto: de nos vermos,
              De nos olharmos,
               De nos ouvirmos,
               De nos sabermos,
               De nos acreditarmos,
               De nos rirmos de nós próprios,

Cada vez menos sós,

Dissipando-se o mar e a solidão
No mágico aprender os outros,
Ouvindo.


Maria de Sousa, in A HORA E A CIRCUNSTÂNCIA de Maria de Sousa e Agostinho da Silva, gradiva, 1988, pp. 122-123
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